Fazer turismo em Belém requer alguns cuidados e um tiquinho de sagacidade.
Os moradores da cidade com que tivemos contato insitiram em nos alertar sobre os perigos da noite e das ruas escuras. De fato, as ruas de Belém são muito mal iluminadas e, em geral, ficam desertas assim que o sol se põe. Isso não quer dizer, contudo, que as ruas sejam, por regra, perigosas. Pelo menos não no sentido que tentaram nos incutir. "Cuidado com a bolsa", "não saiam com muito dinheiro", "não andem a pé", "atenção na praça", foram alguns dos conselhos que recebemos.
Pois contrariamos os cidadãos da capital paraense nesse sentido e batemos muita perna pela cidade, tanto de dia como à noite. E então formamos nossa própria opinião, fundamentada no que vimos lá e no que vemos aqui, no centro de SP.
Andar em Belém requer, sim, muito cuidado. Cuidado nas calçadas, que em geral são estreitas e estão em péssimo estado. Cuidado também na sarjeta, que é absurdamente larga e funda. Dizem que as calçadas são ruins e as sarjetas, profundas, por causa das águas das chuvas. Ok, o aguaceiro que desaba sobre a cidade todos os dias realmente necessita de um escoadouro, ou as ruas ficariam inundadas diariamente. Mas há inúmeras soluções melhores do que simplesmente abrir valas de mais de um metro entre a rua e a guia, ora pois! Inúmeras vezes precisei da ajuda do meu cabeçudinho para saltar da calçada para o asfalto, outras tantas acabei enfiando o pé na sarjeta - invariavelmente melequenta -, e outras tantas ainda tive de pôr à prova minhas habilidades de Maurren Maggi. Tudo bem que tenho pouco mais de metro e meio de altura, mas e as crianças da cidade, como fazem?
Como se não bastassem as calçadas mal conservadas e as sarjetas profundas, em geral o passeio é estreito e abriga postes, lixo ou mesmo camelôs. E nas ruas - muitas delas estreitas - há, ainda, carros estacionados - que não ficam muito rente à guia, justamente por causa da sarjeta. Enfim, com essa mistura fantástica, não resta muita coisa ao pedestre a não ser ficar esperto para não tocer o tornozelo, não enfiar o pé na lama nem ser atropelado.
Com esperteza a tiracolo, grande parte do perigo de andar em Belém está vencido. E as ruas, mesmo à noite, não são tão mal frequentadas como nos disseram - ao contrário, o problema é justamente o fato de as pessoas frequentarem muito pouco as ruas mais centrais da cidade. Nessas áreas, as pessoas transitam basicamente de carro particular e, pelo que notamos, mesmo que desejem ir até o restaurante da esquina. Isso não é exclusividade de Belém, mas uma moda muito chata de algumas cidades que conhecemos, São Paulo inclusive. Ainda assim, persistimos em nossa convicção de que a cidade, para ser viva, precisa ser usada e ocupada por seus moradores. Com boa iluminação e transeuntes contumazes, poucas ruas permanecem inseguras.
Assim, caminhamos por boa parte da cidade e ainda usamos alguns ônibus para ir do centro ao bairro, do bairro ao centro. Como no dia em que fomos ao mercado de São Brás, por exemplo. Cansada que estava de esfolar os pés no calçamento acidentado, pedi água ao meu cabeçudinho, e então usamos o transporte coletivo municipal. O mercado, aliás, é muito bonito por fora e um tanto decepcionante por dentro. Isso porque a parte externa foi reformada recentemente e, como outros pontos turísticos de Belém, carrega imponência. Internamente, porém, o mercado de São Brás assemelha-se a um reles camelódromo, inclusive com barraquinhas de CDs piratas. A única indicação de que não estávamos em SP era a banca de camarão seco!
O Forte do Presépio é outro ponto turístico de Belém. Também conhecido como Forte do Castelo, poderia ser chamado ainda de Forte Nada Pode. Porque lá nada pode ser feito mesmo. Passeamos no seu entorno e apreciamos a bela vista do rio. Mas não pudemos entrar no Forte porque era dia de limpeza. Meu cabeçudinho não pôde tirar a camiseta na área externa e aberta e pública e praticamente na rua, só porque estava perto do Forte e no Forte nada pode. Vimos ainda os guardas chamarem a atenção de um rapaz, porque ele se deitara no colo de sua namorada. Mais uma vez, no banco da praça na área externa e aberta e pública e quase na rua, mas não podia, porque estava perto do Forte e no Forte nada pode. Também não podia subir em muretas que convidavam a ver o rio e... Enfim, ficamos indignados com as regras ilógicas e partimos para outro lugar.
Para nossa infelicidade, era segunda-feira, dia de não-turismo em Belém. Por um desígnio de racionalidade duvidosa, todos os pontos turísticos da cidade ficam fechados nesse dia da semana. Ou seja, plena segunda-feira, você com dinheiro pra gastar e desejo de passear, e nada pra fazer na cidade, a não ser torcer o tornozelo na calçada ou fotografar tudo de longe, longe... se é que pode tirar foto!
22 de março de 2011
16 de março de 2011
Nas docas
Eu tenho lá minha opinião a respeito da cidade de Belém e o que ela faz com e para os turistas que recebe. Mas é impossível não reconhecer um de seus grandes êxitos: a constituição da Estação das Docas.
No local há uma painel bastante interessante que conta a história do porto, sua decadência e posterior recuperação, até a inauguração do atual polo turístico, artístico e gastronômico da cidade.
Três galpões enormes constituem a Estação, que tem vista para o rio, de um lado, e rua histórica, de outro. Cada um dos galpões recebeu um nome temático: Boulevard das Artes, Boulevard da Gastronomia e Boulevard das Feiras e Eventos. Este último, pelo que pude entender, é locado para as mais diversas finalidades, como casamentos, formaturas e eventos empresariais. Em termos de originalidade, o espaço é inigualável.
Obviamente o boulevard que mais frequentamos foi o da gastronomia, onde se encontram alguns dos melhores restaurantes da cidade. Fizemos ótimas refeições na Estação das Docas e ainda tomamos o melhor chope de nossas vidas, se considerarmos nesse ranking o preço por ml.
Ao fundo, construções de uma época em que Belém foi muito rica
No interior dos galpões, os paraenses disputam as mesas, numa obsessão terrível pelo ar condicionado. Felizmente eu e meu cabeçudinho não somos adeptos do clima polar - que além de ressecar as narinas, ainda resfria a comida em poucos minutos, eca! Então, na maioria das refeições sentamo-nos no lado de fora dos armazéns. Nas mesas externas, além de podermos apreciar nossas iguarias sem medo de que resfriassem demais, ainda podíamos curtir a vista do rio, que a cada momento mudava de cor e de penteado.
Sentados ao lado do rio, vimos navios enormes passarem, com seus tripulantes acenando de toda parte. Coisa de filme. Vimos também as embarcações turísticas saindo do pequeno cais, rumo a passeios pela orla de Belém - no pôr-do-sol ou logo ao anoitecer. Também nos divertimos com alguns pardais ousados, que vinham buscar alguma migalha saborosa entre as mesas. E, ainda, com música ao vivo! Instaladas em uma plataforma, as bandas tocavam estilos variados, deslizando sobre as mesas da Estação. Como se, literalmente, a música viesse dos ares.
Passear nas Docas logo se tornou meu programa padrão em Belém - deu fome? vamos para as Docas! deu sede? vamos para as Docas! deu tédio? vamos para as Docas! E até quando não deu nada, fomos para as Docas, comer, beber, tomar sorvete, fazer compras ou simplesmente olhar o rio!
Mesas vazias, sorte nossa: tivemos exclusividade no espetáculo do rio transmutante
4 de março de 2011
Lula não vem de Belém
Mas nós fomos a Belém e comemos lula, sim!
No primeiríssimo dia na cidade, fomos recebidos com chuva e calor. Passeamos um tanto desnorteados e - surpresa chata - descobrimos que o restaurante indicado pelo meu tio havia fechado. Sem muito o que fazer além de continuar buscando um lugar pra comer, caminhamos pelas ruas escuras do bairro, guiados um pouco pelo instinto (chamado fomeeeeeee!), um pouco pelo bom senso.
Chegamos então a uma rua de restaurantes bacanas. Instalados em casas enormes - e todas as construções pecam pelo excesso de grandez na capital paraense -, os comércios pareciam um tanto chiques por fora. Da rua, pouco se via de movimento, uma vez que a gente rica de lá é como a maioria da gente rica daqui: só sai de casa se for de carro.
Passamos por um pub que parecia animado, mas estava apinhado de homens, e mais homens, e mais homens! Não vi uma mulher sequer no ambiente e eu mesma "pedi pra sair". Saímos depressa, constrangidos, como se aquilo ali fosse uma casa de massagem ou coisa do gênero. Eu hein.
Prosseguimos na caminhada e passamos por um restaurante de cozinha contemporânea. Salão amplo, mesas enormes, ambiente bastante iluminado. E vazio. A cena se repetiu em outras casas, até que chegamos a um ristorante um tanto parecido com as cantinas do bairro paulistano do Bixiga. Sentimo-nos em casa, meu descendente de cearense e eu, a japa tipicamente paraguaia.
Mesmo sem querer, acertamos em cheio na escolha. A casa era mesmo uma cantina tradicional, com quadros curiosos que se relacionavam a futebol, várias quinquilharias espalhadas pelas paredes e o esperado trio vermelho, verde e branco na decoração.
Servimo-nos no buffet de antepastos, vendido a quilo, e foi então que o sorriso voltou aos nossos rostos. Berinjela, queijo, presunto cru... não lembro mais qual iguaria foi a minha favorita, mas estou certa de que valeu provar de tudo um pouco.
Em seguida chegou nosso pedido: risoto com tinta de lula!
Jamais havia comido esse prato, mas posso garantir que estava muito bom. O arroz estava numa textura ótima, e por incrível que pareça, o tom enegrecido da tinta da lula dá um toque muito apetitoso ao risoto.
Eu e meu cabeçudinho devoramos o risoto, e ainda sobrou um tanto no prato. Não é pra menos, o sabor é bem marcante - não é pra maricas!
Conforme percebemos mais tarde, a cantina era bastante movimentada, frequentada principalmente por pessoas endinheiradas da cidade. Turistas? Que nada, nós destoávamos completamente do restante dos comensais. De chinelo e bermuda, éramos os únicos a não trajar roupa de domingo. Tudo bem, era sexta-feira e lá fora chovia e fazia calor!
No primeiríssimo dia na cidade, fomos recebidos com chuva e calor. Passeamos um tanto desnorteados e - surpresa chata - descobrimos que o restaurante indicado pelo meu tio havia fechado. Sem muito o que fazer além de continuar buscando um lugar pra comer, caminhamos pelas ruas escuras do bairro, guiados um pouco pelo instinto (chamado fomeeeeeee!), um pouco pelo bom senso.
Chegamos então a uma rua de restaurantes bacanas. Instalados em casas enormes - e todas as construções pecam pelo excesso de grandez na capital paraense -, os comércios pareciam um tanto chiques por fora. Da rua, pouco se via de movimento, uma vez que a gente rica de lá é como a maioria da gente rica daqui: só sai de casa se for de carro.
Passamos por um pub que parecia animado, mas estava apinhado de homens, e mais homens, e mais homens! Não vi uma mulher sequer no ambiente e eu mesma "pedi pra sair". Saímos depressa, constrangidos, como se aquilo ali fosse uma casa de massagem ou coisa do gênero. Eu hein.
Prosseguimos na caminhada e passamos por um restaurante de cozinha contemporânea. Salão amplo, mesas enormes, ambiente bastante iluminado. E vazio. A cena se repetiu em outras casas, até que chegamos a um ristorante um tanto parecido com as cantinas do bairro paulistano do Bixiga. Sentimo-nos em casa, meu descendente de cearense e eu, a japa tipicamente paraguaia.
Mesmo sem querer, acertamos em cheio na escolha. A casa era mesmo uma cantina tradicional, com quadros curiosos que se relacionavam a futebol, várias quinquilharias espalhadas pelas paredes e o esperado trio vermelho, verde e branco na decoração.
Servimo-nos no buffet de antepastos, vendido a quilo, e foi então que o sorriso voltou aos nossos rostos. Berinjela, queijo, presunto cru... não lembro mais qual iguaria foi a minha favorita, mas estou certa de que valeu provar de tudo um pouco.
Em seguida chegou nosso pedido: risoto com tinta de lula!
Jamais havia comido esse prato, mas posso garantir que estava muito bom. O arroz estava numa textura ótima, e por incrível que pareça, o tom enegrecido da tinta da lula dá um toque muito apetitoso ao risoto.
Eu e meu cabeçudinho devoramos o risoto, e ainda sobrou um tanto no prato. Não é pra menos, o sabor é bem marcante - não é pra maricas!
Conforme percebemos mais tarde, a cantina era bastante movimentada, frequentada principalmente por pessoas endinheiradas da cidade. Turistas? Que nada, nós destoávamos completamente do restante dos comensais. De chinelo e bermuda, éramos os únicos a não trajar roupa de domingo. Tudo bem, era sexta-feira e lá fora chovia e fazia calor!
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